Principais tópicos do Compromisso da Cidade do Cabo

Documento gerado no Congresso Lausanne de Evangelização Mundial em 2010

Marcos Amado

Em outubro de 2010, mais de 4 mil líderes cristãos de 198 países se reuniram na Cidade do Cabo, África do Sul, para discutir questões críticas da época relacionadas à igreja e à evangelização. Foi o Terceiro Congresso Lausanne de Evangelização Mundial (o primeiro aconteceu em 1974, e foi convocado por Billy Graham). Como resultado desse encontro, foi redigido o Compromisso da Cidade do Cabo (CCC), que contou com Christopher Wright na coordenação do grupo de trabalho que elaborou o documento.

O texto a seguir, apesar de estar permeado de citações diretas do CCC, não tem por objetivo substituir o documento original. Ele foi elaborado com o único propósito de dar a conhecer, de forma sucinta, os principais assuntos abordados no CCC, despertando assim o interesse da liderança evangélica pelo conteúdo em sua íntegra. Sendo assim, em caso de discrepância, o CCC é o único documento válido para elucidar as dúvidas que surgirem.

Introdução

I. Mesmo vivendo em um mundo em constante mudança, existem realidades inalteradas

a. Os seres humanos estão perdidos
b. O evangelho é a boa nova
c. A missão da igreja continua

II. A paixão do nosso amor

a. Nosso amor por todo o evangelho
b. Nosso amor por toda a igreja
c. Nosso amor por todo o mundo

“Toda a igreja, levando todo o evangelho para o mundo todo.” (Pacto de Lausanne)

Primeira Parte – Para o Senhor que amamos: nosso compromisso de fé
I. Nós amamos porque Deus nos amou primeiro

a. O amor a Deus e o amor ao próximo constituem o primeiro e maior mandamento no qual reside toda a lei e os profetas.
b. Tal amor não é fraco nem sentimental. O amor de Deus é um amor comprometido, fiel e que se doa.
c. “Ao firmarmos nossas convicções e nosso compromisso em termos de amor, estamos assumindo o desafio mais básico e difícil de todos os desafios bíblicos” que é amar a Deus, ao próximo, uns aos outros e ao mundo.
d. Esse amor nos foi dado por Deus e, ao mesmo tempo, é um mandamento.

II. Nós amamos ao Deus vivo

a. Nós o amamos acima de todos os rivais.
b. Nós o amamos com paixão pela sua glória. “O mais elevado de todos os motivos missionários não é a obediência à Grande Comissão (…) nem o amor pelos pecadores (…), mas o zelo verdadeiro (…) apaixonado e consumidor pela glória de Jesus Cristo (…).”

III. Nós amamos ao Deus Pai

a. Nós amamos a Deus como o Pai do seu povo.
b. Nós amamos a Deus como o Pai que por ter amado tanto o mundo deu o seu único Filho para a salvação.
c. Nós amamos a Deus como o Pai cujo caráter refletimos e em cujo cuidado confiamos.

IV. Nós amamos ao Deus Filho
“Afirmamos firmemente que somente Ele é Salvador, Senhor e Deus.”

a. Nós confiamos em Cristo. A sua missão foi realizada por meio do seu nascimento, vida, ministério e milagres, na sua morte, ressurreição, ascensão e na sua volta.
b. Nós obedecemos a Cristo. Segui-lo significa abnegação, servidão e obediência.
c. Nós proclamamos Cristo. A salvação é somente através de Cristo.

V. Nós amamos ao Deus Espírito
O Espírito Santo “é o Espírito missionário do Pai missionário e o do Filho missionário, soprando vida e poder na igreja missionária de Deus.”

a. No Antigo Testamento vemos o Espírito de Deus atuando na criação, capacitando, libertando e falando por meio dos profetas de Deus.
b. A partir do Pentecoste, vemos o Espírito Santo capacitando os cristãos com dons e poder para missões e para o serviço.
c. Sem a presença do Espírito Santo nosso engajamento em missões se torna infrutífero.

“Não existe Evangelho verdadeiro nem completo, e nem missão bíblica autêntica sem a Pessoa, a obra e o poder do Espírito Santo.”

VI. Nós amamos a Palavra de Deus
“Recebemos toda a Bíblia como a Palavra de Deus, inspirada pelo Espírito de Deus.”

a. Ela nos oferece a revelação do próprio Deus, da sua identidade, caráter, propósito e ações.
b. Ela nos conta a história universal da criação, queda, redenção e nova criação. “Essa história da missão de Deus define nossa identidade, impulsiona nossa missão e garante que o fim está nas mãos de Deus.”
c. A Bíblia nos ensina todo o conselho de Deus, a verdade que Deus quer que saibamos. Sua mensagem é clara e suficiente para revelar o caminho da salvação.

“Afirmamos que a Bíblia é a palavra final escrita de Deus, que nenhuma outra revelação pode superá-la (…).”

VII. Nós amamos o mundo de Deus

a. Nós amamos o mundo criado por Deus. Tal amor não é simplesmente sentimental, nem panteísta, mas reflete a verdade de que tudo o que há na terra pertence ao Senhor. “Tal amor pela criação de Deus exige que nos arrependamos de nossa participação na destruição, desperdício e poluição dos recursos da terra e da nossa conivência com a idolatria tóxica do consumismo.”
b. Nós amamos o mundo das nações e das culturas. “Devemos amar tudo o que Deus escolheu abençoar, e isso inclui todas as culturas”. Consequentemente, rejeitaremos “os males do racismo e do etnocentrismo” e trataremos “todas as etnias e grupos culturais com dignidade e respeito (…)”. Como resultado desse amor faremos com que o evangelho seja conhecido em todos os grupos étnicos do mundo.
c. Nós amamos os pobres e os sofridos do mundo. Na Bíblia, nós vemos claramente a preocupação de Deus pelo oprimido, pelo estrangeiro, o faminto, o órfão e a viúva. “Tal amor pelo pobre exige (…) que façamos justiça por meio da exposição e oposição de tudo o que oprime e explora o pobre.”
d. Nós amamos nosso próximo como a nós mesmos. Isso faz com que também amemos “pessoas de outras crenças, e se estende para aqueles que nos odeiam, difamam, perseguem e até matam.”
e. O mundo que não amamos. “O mandamento que recebemos é para que não amemos este mundo de desejo, ganância e orgulho pecaminosos. Com tristeza confessamos que são exatamente essas marcas mundanas que com frequência distorcem nossa presença cristã e negam nosso testemunho do evangelho.”

VIII. Nós amamos o evangelho de Deus

a. Nós amamos as boas novas em um mundo de más notícias. “Os efeitos do pecado e do poder do mal têm corrompido cada aspecto da vida humana, espiritual, física, intelectual e relacional.” Diante dessa realidade, “o evangelho bíblico é verdadeiramente boa nova”.
b. Nós amamos a história que o evangelho conta, de que “Deus em Cristo estava reconciliando consigo o mundo”.
c. Amamos a garantia que o evangelho dá, de que, ao confiarmos em Cristo, temos plena certeza de salvação e vida eterna.
d. Nós amamos a transformação produzida pelo evangelho, que é “o poder transformador de vida dado por Deus que opera no mundo”.

IX. Nós amamos o povo de Deus

a. O amor exige unidade. Sem unidade, nosso testemunho ao mundo é destruído.
b. O amor exige honestidade, uma honestidade que confronta o povo de Deus com “amor profético”, mostrando-lhe seu erro, idolatria e rebelião. “Devemos renunciar às idolatrias da arrogância, do sucesso manipulado e da ganância consumista que seduz a tantos de nós e de nossos líderes.”
c. O amor exige solidariedade. Isso deve levar-nos a cuidar dos que são perseguidos e aprisionados por conta do seu amor por Jesus. “Se uma parte do corpo sofre, todos sofrem com ela.”

X. Nós amamos a missão de Deus
“Toda a Bíblia revela a missão de Deus, de convergir a Cristo todas as coisas no céu e na terra, reconciliando-as através do sangue da sua cruz”, transformando “em uma nova criação a criação destruída pelo pecado (…)”.

a. Nossa participação na missão de Deus. Nós, como povo de Deus, somos chamados a fazer parte da sua missão. Devemos ser benção e luz para todas as nações.
b. O custo da nossa missão. O sofrimento faz parte do nosso esforço de testemunhar de Cristo. “Deus pode usar o sofrimento, a perseguição e o martírio para avançar sua missão.”
c. A integridade da nossa missão. “Evangelização propriamente dita é a proclamação do Cristo bíblico e histórico como Salvador e Senhor, com o intuito de persuadir as pessoas a virem a ele pessoalmente, e, assim, se reconciliarem com Deus (…).” Um dos resultados da evangelização é “um serviço responsável no mundo”. Portanto, “a evangelização e o envolvimento sócio-político são ambos parte do nosso dever cristão”.

Segunda Parte – Para o mundo que servimos: o chamado à ação da Cidade do Cabo

Nosso amor ao Senhor deve levar-nos à obediência e à ação. O chamado à ação da Cidade do Cabo destaca seis temas que nos ajudam a entender quais são os principais desafios da igreja e as prioridades para o futuro.

A. Testemunhando da verdade de Cristo em um mundo pluralista e globalizado.

1. A verdade e a pessoa de Cristo. Jesus Cristo é a verdade do universo, e essa verdade é “(i) pessoal bem como proposicional; (ii) universal bem como contextual; (iii) final bem como presente”.

A) Como discípulos de Cristo, somos chamados para ser pessoas da verdade. Portanto, nós devemos:
(a) Viver a verdade, que significa ser a face de Jesus.
(b) Proclamar oralmente a verdade (que continua sendo parte fundamental no cumprimento da nossa missão), mas sem deixar de viver a verdade.
B) Os líderes da igreja são conclamados a pregar o evangelho bíblico na sua plenitude, e não simplesmente como uma oferta para solucionar os problemas das pessoas.

2. A verdade e o desafio do pluralismo. Os cristãos de certas partes do mundo convivem, há séculos, com o pluralismo cultural e religioso. Porém, o pluralismo relativista pós-moderno apresenta um desafio singular, já que “sua ideologia não permite a verdade universal ou absoluta”, e, em alguns países, pode tomar formas opressivas.

A) Por isso, há necessidade de um comprometimento sério com uma apologética consistente.

3. A verdade e o local de trabalho. Devemos eliminar a falsa divisão entre trabalho secular e sagrado. A maioria dos cristãos passa a maior parte do seu tempo no trabalho, e precisamos prepará-los para que saibam como aproveitar as oportunidades que surgem nesse contexto.

A) Ministério e missão não são trabalhos apenas de ministros e missionários pagos pela igreja.
B) “Desafiamos pastores e líderes (…) ‘a preparar os santos para a obra de ministério’ em todas as áreas de suas vidas.”
C) Todo o povo de Deus precisa estar preparado para, em qualquer lugar, ser fiel testemunha. O que os “cristãos com diferentes habilidades, ofícios, negócios e profissões (‘fazedores de tendas’)” fazem no local de trabalho deve ser visto como ministério.
D) Os líderes da igreja precisam entender o impacto estratégico do ministério no local de trabalho, tanto em suas comunidades locais como em países fechados ao evangelho.
E) “Apelamos aos líderes missionários que integrem (…) os ‘fazedores de tenda’ na estratégia missionária global.”

4. A verdade e a mídia globalizada. É necessário um engajamento “crítico e criativo com a mídia e com a tecnologia como parte da defesa da verdade de Cristo em nossas culturas das mídias”. As principais necessidades são:

A) Criar uma consciência mais crítica sobre o que a mídia propaga.
B) Uma maior presença cristã na mídia, tanto por meio do conteúdo como por meio de cristãos verdadeiros trabalhando na mídia.
C) Fazer uso criativo das diferentes mídias para a comunicação de um evangelho bíblico.

5. A verdade e a arte em missões. É preciso explorar melhor o recurso da arte na nossa missão de proclamar a verdade. “Os artistas, no seu melhor, são narradores da verdade (…). O teatro, a dança, a história, a música e as artes plásticas podem expressar a realidade de nossa condição de perdidos e a esperança (…) de que tudo pode ser novo.”

A) A igreja, em todas as culturas, deve usar “amplamente as artes como um contexto para missões”.

6. A verdade e as tecnologias emergentes. O avanço das tecnologias emergentes (bio, info/ digital, nano, realidade virtual, inteligência artificial e robótica) “tem grandes implicações para a igreja e para as missões, principalmente em relação à verdade bíblica sobre o que significa ser humano”. Precisamos oferecer respostas genuinamente cristãs para que a tecnologia seja usada de maneira que permita e preserve “a completude de nossa humanidade, como aqueles que Deus criou conforme a sua imagem”. Para isso, é necessário o envolvimento de líderes de igrejas locais, seminários, assim como teólogos e profissionais cristãos das áreas afins.

7. A verdade e as arenas públicas. Os cristãos devem estar ativamente envolvidos nas áreas governamental, empresarial e acadêmica “a fim de moldar valores sociais e influenciar o debate público”. Dentro desse contexto, a luta contra a corrupção deve ser uma prioridade. Além disso, os jovens cristãos “devem considerar uma carreira de longo prazo em universidades seculares” com o intuito de “ensinar e desenvolver suas disciplinas a partir de uma perspectiva bíblica”.

B. Construindo a paz de Cristo em nosso mundo dividido e ferido

1. A paz que Cristo promoveu. Através da cruz de Cristo, a divisão entre judeus e gentios deixou de existir. “O plano de Deus para a integração de toda criação em Cristo está moldado na reconciliação étnica da nova humanidade de Deus.” Não há diferença de salvação entre judeus e gentios. Portanto, os judeus “ainda precisam de reconciliação com Deus através do Messias Jesus”, o que deve levar a igreja a continuar compartilhando as boas novas com o povo judeu.

2. A paz de Cristo no conflito étnico. “A diversidade étnica será preservada na nova criação”, mas nós, cristãos, muitas vezes não damos a importância que a própria Bíblia dá a esse assunto, e é necessário que os líderes cristãos ensinem sobre isso. Infelizmente, ao longo dos séculos, os cristãos foram cúmplices de conflitos étnicos (a escravidão, o holocausto, o apartheid e outros envolvendo o racismo etc.). Portanto, precisamos chamar os cristãos ao arrependimento. “Nós ansiamos pelo dia em que a igreja será para o mundo o mais brilhante e visível modelo de reconciliação étnica (…).”

3. A paz de Cristo para o pobre e oprimido. Precisamos ver a igreja erguendo-se contra a escravidão, o tráfico humano e a pobreza. “Os escravos em todo o mundo apelam à igreja de Cristo: ‘Libertem nossas crianças [e] nossas mulheres (…), mostrem-nos a nova sociedade que Jesus prometeu’.” Também precisamos reconhecer que “o evangelho desafia a idolatria do consumismo desenfreado. Somos chamados, como servos de Deus e não de mamom, a reconhecer que a ganância perpetua a pobreza, e que devemos renunciá-la”.

4. A paz de Cristo para as pessoas com deficiência. As estatísticas afirmam que existem mais de 600 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência. Como corpo de Cristo, precisamos lutar ao lado dessas pessoas e de suas famílias por inclusão e igualdade.

5. A paz de Cristo para as pessoas que vivem com o HIV. “Nós acreditamos que o ensinamento e o exemplo de Jesus, assim como o poder transformador da sua cruz e ressurreição, são essenciais para a resposta holística do evangelho para o vírus HIV e a Aids, que nosso mundo precisa tão urgentemente.” Portanto, precisamos unir-nos aos irmãos e irmãs ao redor do mundo e prestar nosso “apoio prático, cuidado compassivo (…), defesa social e política, programas de educação (…) e estratégias de prevenção eficazes (…)”.

6. A paz de Cristo para sua criação em sofrimento. A terra pertence a Deus e a nós nos cabe “exercer o domínio piedoso ao usá-la tendo em vista o bem-estar do ser humano e suas necessidades (…)”. Porém, como resultado de termos sido maus mordomos dos recursos naturais que nos foram dados por Deus, estamos enfrentando destruição da biodiversidade e grandes mudanças climáticas, o que está afetando com mais rigor as regiões mais pobres da Terra. Pensando nesses desafios, os cristãos de todo o mundo deveriam mudar seus estilos de vida, buscar meios legítimos para influenciar os governos, e reconhecer e incentivar os que têm chamado missionário para atuar nessa área.

C. Vivendo o amor de Cristo entre pessoas de outras crenças

1. “Ame o seu próximo como a si mesmo” inclui pessoas de outras crenças. As pessoas de outras crenças são pessoas pelas quais Cristo morreu, e foram criadas à imagem e semelhança de Deus. “Nós nos esforçamos não apenas para vê-las como nosso próximo, mas para obedecer aos ensinamentos de Cristo sendo para elas o seu próximo.” Faremos evangelismo sendo sensíveis a elas, mas não faremos “proselitismo indigno”, que visa obrigar os de outras crenças a se converterem ao cristianismo. “Nos recusamos a divulgar mentiras e caricaturas sobre outras crenças, e denunciamos e resistimos ao preconceito racista, ao ódio e ao medo incitado na mídia popular e na retórica política.”

2. O amor de Cristo nos chama ao sofrimento e até a morrer pelo evangelho. Seguindo o exemplo dos apóstolos e dos profetas, devemos estar prontos a sofrer no nosso envolvimento missionário. “Muitos cristãos que vivem no conforto e na prosperidade precisam ouvir novamente o chamado de Cristo para estarem dispostos a morrer por ele.” Ao mesmo tempo, nos lembramos daqueles que, em diferentes partes do mundo, sofrem pelo evangelho (e oramos!), sem nos esquecermos da tristeza de Deus por conta dos que “resistem e rejeitam seu amor, seu evangelho e seus servos”.

3. O amor em ação personifica e manifesta o evangelho da graça. Naqueles lugares do mundo onde o conceito da graça de Deus pode ser visto como algo estranho, nosso testemunho de “amor personificado” fará com que, com o tempo, “o aroma de Cristo ❲permeie❳ gradativamente tudo aquilo com o que seus seguidores entram em contato”.

4. O amor respeita a diversidade de discipulado. Em algumas partes do mundo, pessoas de outras religiões que decidiram seguir a Cristo o fazem em comunhão com pequenos grupos de cristãos, “mas continuam a viver social e culturalmente dentro de suas comunidades, observando, inclusive, alguns de seus elementos religiosos”. Esse é um assunto complexo, em que não há unanimidade. Por isso, não devemos ser demasiadamente rápidos para condenar, nem tampouco para aprovar, sendo humildes, pacientes e bondosos “para reconhecer a diversidade de pontos de vista, e manter conversas sem estridência nem condenação mútua”.

5. O amor alcança os povos dispersos. As estatísticas afirmam que existem mais de 200 milhões de pessoas ao redor do mundo vivendo na diáspora, ou seja, longe da sua terra natal. Muitos foram desalojados por conta dos desastres naturais, fome, guerras ou outras formas de violência. “Nós incentivamos a igreja (…) a reconhecer e responder às oportunidades missionárias apresentadas pela migração global e pelas comunidades em diáspora (…)”. Da mesma forma, os cristãos que vivem na diáspora devem aproveitar a oportunidade para testemunhar de Cristo no país anfitrião.

6. O amor trabalha pela liberdade religiosa para todos. Como cristãos, devemos trabalhar pela liberdade religiosa tanto de cristãos como de pessoas de outras religiões. Defender a liberdade religiosa de pessoas de outras crenças não significa endossar o que elas creem. O cristão, onde quer que esteja, submeter-se-á ao Estado. Porém, nossa primeira lealdade será sempre a Deus, e é esse o princípio que nos guiará em caso de divergência. Mesmo reconhecendo o direito legítimo de todos terem liberdade religiosa, “o desejo mais profundo de nosso coração continua sendo que todos venham a conhecer o Senhor Jesus Cristo, que livremente depositem nele sua fé, e que sejam salvos e entrem no reino de Deus”.

D. Discernindo a vontade de Cristo para a evangelização mundial

1. Os povos não alcançados e não incluídos. Ainda existem muitos povos ao redor do mundo onde não há cristãos conhecidos. Em alguns deles, já há um esforço missionário sendo realizado (povos não alcançados), porém há outros em que ainda não se conhece nenhum trabalho missionário entre eles (povos não incluídos). Precisamos nos arrepender da nossa passividade em relação à evangelização mundial, e renovar nosso compromisso de irmos àqueles que ainda não ouviram as boas novas. Para isso, é importante que também haja, por meio de diferentes iniciativas, um esforço para a erradicação da “pobreza bíblica no mundo” (já que a Bíblia “continua sendo indispensável para o evangelismo”), assim como um esforço para “a erradicação da ignorância bíblica na igreja”. Para esse fim, devemos reconhecer e preparar pastores e leigos para o ministério do ensino. A instrução bíblica deve se adaptar aos tempos atuais, fazendo uso das ferramentas digitais. Tudo isso sem nos esquecermos de “manter o evangelismo como parte central do escopo plenamente integrado de toda a missão”.

2. Culturas orais. “A maior parte da população mundial é formada por comunicadores orais”. Desses, estima-se que cerca de 350 milhões não possuem “um único versículo das escrituras na sua língua”. Por isso, devemos conscientizar igrejas e seminários sobre essa necessidade, “fazer melhor uso das metodologias orais (…), disponibilizar histórias bíblicas (…), incentivar as agências missionárias a desenvolver estratégias” que incluam a comunicação oral.
3. Líderes cristocêntricos. “A escala de líderes mundanos e não semelhantes a Cristo na igreja global é hoje prova patente de evangelismo reducionista, discipulado negligenciado e crescimento superficial.” Precisamos, portanto, de um maior esforço para discipular aqueles que, mostrando um caráter piedoso, serão líderes da igreja. “Líderes autenticamente cristãos devem ser semelhantes a Cristo no que se refere a ter humildade, integridade, coração servil, ausência de ganância, vida de oração, dependência no Espírito de Deus e um profundo amor pelas pessoas.” Seminários e programas de treinamento de líderes devem se concentrar mais “na formação espiritual e de caráter, e não apenas na transmissão de conhecimento ou classificação de desempenho (…)”.

4. Cidades. Precisamos, urgentemente, dar especial atenção à missão urbana, já que hoje metade da população mundial vive em cidades.

5. Crianças. “Todas as crianças [do mundo] estão em risco (…). Metade delas está em risco em decorrência da pobreza. Milhões estão em risco em decorrência da prosperidade. Os filhos dos ricos e estáveis têm tudo para viver, mas nado pelo que viver.” Portanto, nossas estratégias de evangelismo e discipulado precisam levar as crianças a sério, preparando material, treinando pessoas e protegendo as crianças de qualquer tipo de abuso.

6. Oração. “Diante de tantas prioridades, vamos renovar nosso compromisso de orar. A oração é um chamado, um mandamento e um dom. A oração é o fundamento indispensável para todos os elementos da nossa missão.”

E. Chamando a igreja de Cristo de volta à humildade, à integridade e à simplicidade.

1. Andar de maneira diferenciada, como nova humanidade de Deus. O povo de Deus foi chamado para ser benção entre as nações. Porém, a idolatria entre o próprio povo de Deus é o maior obstáculo para a realização dessa missão. “Quando não há diferença entre cristãos e não cristãos – por exemplo, na prática da corrupção e na ganância, na promiscuidade sexual, no alto índice de divórcio, no retorno a práticas anteriores à religião cristã, na hostilidade em relação a pessoas de outras raças, nos estilos de vida consumistas ou no preconceito social —, então, o mundo está certo ao questionar se o cristianismo faz alguma diferença.”

2. Andar em amor, rejeitando a idolatria da sexualidade desordenada. O propósito de Deus é que a relação sexual seja desfrutada somente dentro do contexto do casamento entre um homem e uma mulher. Porém, tanto na sociedade em geral como na igreja, vivemos numa época de idolatria à sexualidade desordenada. “Ansiamos por ver cristãos desafiando as culturas que nos rodeiam vivendo de acordo com os padrões para os quais a Bíblia nos chamou.”

3. Andar em humildade, rejeitando a idolatria do poder. A rejeição a essa idolatria deve levar os cristãos a se submeterem uns aos outros em todos os níveis de relacionamento. “Em um mundo de poder, ganância e abuso, Deus está chamando sua igreja para ser o lugar de humildade amável e amor abnegado entre seus membros.”

4. Andar em integridade, rejeitando a idolatria do sucesso. No nosso afã de sermos bem-sucedidos e de obtermos resultados, acabamos sacrificando nossa integridade “com alegações exageradas e distorcidas que levam a mentiras”. Portanto, “apelamos a todos os líderes e missionários que resistam à tentação de ser menos que totalmente verdadeiros na apresentação do seu trabalho”.

5. Andar em simplicidade, rejeitando a idolatria da ganância. A disseminação do “evangelho da prosperidade” levanta sérias preocupações, já que os arautos desse evangelho ensinam que “os crentes têm direito a bênçãos (…), e que podem obter essas bênçãos por meio de confissões positivas de fé e da ‘semeadura’ (doações financeiras e materiais)”. Nós cremos no poder de Deus e na sua ação milagrosa. Porém, “negamos que o poder milagroso de Deus possa ser tratado como uma técnica automática (…)”, ou que possa ser manipulado. Apesar de Deus poder abençoar com bens materiais, “consideramos como contrário à Bíblia o ensinamento de que o bem-estar espiritual possa ser medido em termos de bem-estar material”. A riqueza não é sempre sinal do olhar favorável de Deus, assim como a pobreza nem sempre é sinal de maldição de Deus. “Onde houver o ensino da prosperidade no contexto de pobreza, devemos nos opor a ele, com compaixão autêntica e ação que traga justiça e transformação duradoura para o pobre.”

F. Formando parcerias no corpo de Cristo pela unidade em missões

1. Unidade na igreja. “Uma igreja dividida não tem mensagem para um mundo dividido.” Portanto, devemos fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para manter a unidade do corpo, buscando “caminhos de reconciliação e de restauração da unidade sempre que possível”.

2. Parceria em missão global. O crescimento do movimento missionário em países em desenvolvimento é uma realidade. Porém, “não aceitamos a ideia de que o bastão da responsabilidade sobre missões tenha passado de uma parte da igreja mundial para outra”. O cumprimento da grande comissão é tarefa de todos os cristãos de todas as partes do mundo. Trabalharemos “por reciprocidade verdadeira entre Norte e Sul, Leste e Oeste, por interdependência em dar e receber (…)”.

3. Homens e mulheres em parceria. Homem e mulher foram criados à imagem e semelhança de Deus, e possuem o mesmo valor diante dele. “Defendemos a posição histórica de Lausanne: ‘Nós afirmamos que os dons do Espírito são distribuídos a todo o povo de Deus, mulheres e homens, e que a parceria deles na evangelização deve ser bem recebida, visando ao bem comum’.”

4. Educação teológica e missões. “A missão da igreja na terra é servir a missão de Deus, e a missão da educação teológica é fortalecer e acompanhar a missão da igreja.” Sendo assim, aqueles que oferecem educação teológica precisam garantir que ela seja intencionalmente missional, uma vez que seu lugar na área acadêmica (…) é servir a missão da igreja no mundo.

Sobre o autor
Marcos Amado é graduado em Teologia pelo All Nations Christian College (Reino Unido) e Mestre em Missiologia com Especialização em Estudos Islâmicos pela mesma instituição. Em Beirute, Líbano, cursou Estudos Avançados em Religiões e Culturas do Oriente Médio no Institute of Middle East Studies. Com mais de 23 anos de experiência transcultural, é fundador e diretor do Martureo Instituto de Reflexão Missiológica.

Compartilhe!
0
    0
    Seu carrinho
    Seu carrinho está vazioVoltar para as compras